O caso da vereadora Marielle
Franco faz emergir uma questão que vem se agravando no dia-a-dia da população fluminense,
mas se engana quem crê que o fio condutor da discussão é a morte violenta de
mais de seis mil e setecentas pessoas, dentre elas cento e trinta e quatro
policiais, apenas no ano passado, trazendo em números a realidade de caos e
medo de todos os setores da sociedade civil do Rio de Janeiro. A principal questão
é ética, e tem a ver com a perda da capacidade de se indignar do brasileiro, representada
por mensagens nas mídias sociais dando conta em diminuir a importância do
assassinato de Marielle, face as milhares de mortes sem nenhuma repercussão e
sem nenhum resultado investigativo, achincalhando os populares ou os
partidários da vereadora, que foram às ruas cobrar providências e resultados
efetivos da investigação do caso, dizendo ironicamente: “foi só mais uma que
morreu”, “porque não cobram a investigação dos policiais mortos”, “agora vamos
re-incluir na sociedade seus assassinos, pois são alvos do meio em que vivem”,
dentre outras falácias bizarras e absurdas.
O brasileiro perdeu a capacidade
de se indignar e esquece que não se trata em discutir qual a vida mais
importante, se a de um simples brasileiro ou de uma autoridade policial ou de
uma autoridade legislativa, trata-se, sim, de um símbolo, de uma representante
de dezenas de milhares de pessoas que foi abruptamente calada e que deve, ter
seu motivo esclarecido e seus envolvidos presos. E devem ser presos obedecendo
os preceitos constitucionais e legais do país.
A mobilização entorno do caso de
Marielle não tem a ver com partido político, com bandeiras, com orientações,
tem a ver com humanidade, com respeito, com dignidade e principalmente com o
Estado Democrático de Direito. O brasileiro perdeu a capacidade de se indignar
e não entende que a vereadora morta, cala sistematicamente a voz dos mais de quarenta
e seis mil cidadãos que a elegeram, cala suas causas, emudece seus direitos e
não deve encontrar justificativa em nada. Nada justifica o que aconteceu. Nada
justifica os mais de cinquenta e oito mil assassinatos nos últimos dez anos
somente no Rio de Janeiro.